a tragédia começa no nariz
Tenho o nariz entupido. Tenho medo de morrer. Um clássico, eu sei. Sou homem e os homens não podem apanhar uma gripezinha que ficam logo não sei quê inserir clichê dito por mulheres que são todas muito fortes. Eu não sou. Nem mulher nem forte. Não neste caso que, para mim, é de vida ou morte. E não me ajuda nada falar ou escrever sobre isto porque, falando ou escrevendo, estou a lembrar-me constantemente de que tenho o nariz entupido e de que, ordem natural das coisas, vou morrer. Então falo e escrevo sobre isto, que esperteza. Acho que nunca nenhuma pessoa morreu por ter o nariz entupido, mas eu tenho sempre a forte convicção de que eu serei a primeira. Por isso é que, há coisa de meia hora, depois de ter passado o efeito de umas super gotas, saí do quentinho da minha casa para partir em busca de uma caixa de victans. Se é para morrer por culpa do nariz entupido, ao menos que esteja drogado, a dormir. Também encontrei uma pomada toda ninja. E tenho livros e um gato e um caderno onde aponto o que encontro e me apetece guardar. «”A comédia começa nas pernas”, Jacques Tati». (Só aponto o que encontro no caderno, não no gato, por vezes nos livros.) Sou capaz de morrer um dia destes, nunca se sabe. Já sei. A tragédia começa no nariz, André Pereira.
uma noite e uma tarde
Uma noite e uma tarde no Teatro da Comuna. Sozinha, com tanta gente ao lado, a Maria riu, cantou e chorou. E fez com que tanta gente tivesse rido, cantado e chorado – a toda esta gente eu só posso dizer obrigado. Eu, que apenas escrevi e ajudei a criar, ri, cantei e fartei-me de chorar. Culpa da Neide, Maria sem lugar.
palavra de honra
JÁ NÃO HÁ PACIÊNCIA… para abacate. É abacate ao pequeno-almoço, abacate ao almoço, abacate ao lanche, abacate ao jantar, abacate na torrada, abacate no frango, abacate no soro da quimioterapia… Raios partam o abacate.
DETESTO… ter o nariz entupido e tomar decisões.
A IDEIA… é bastante polémica, não sei se o mundo está preparado para ela, mas cá vai: não sair da zona de conforto. Se é zona de conforto, e se conforto significa prazer, por que raio é que temos de sair de lá?
QUESTIONO-ME SE… é assim tão saudável eu questionar-me. Se não seria preferível eu andar por aí a fazer perguntas aos outros e não a mim.
ADORO… não ter o nariz entupido e tomar decisões.
LEMBRO-ME TANTAS VEZES… de jogar num campo que ainda existe, mas que o Presidente da minha terra diz que não.
DESEJO SECRETAMENTE… nada. Desejo sempre de forma pública. Um beijo, Lúcia Moniz.
TENHO SAUDADES… de ambientes que não são intimistas, de exposições que não são imersivas e de amigos que não são amigos dos seus amigos.
O MEDO QUE TIVE… quando, a 11 de Maio de 2013, vi o Roderick Miranda a aquecer… Confirmou-se.
SINTO VERGONHA ALHEIA… de quem leu este início de frase e disse vergonha alheira.
O FUTURO… a Deus pertence, claro está, visto que nem um nem outro existem.
SE EU ENCONTRAR… a palavra Liberdade no primeiro discurso de Paulo Raimundo como secretário-geral do PCP, inscrevo-me no Partido*. Até agora, ainda só encontrei as palavras Força 18 vezes e Luta 21 vezes. *10 vezes
PROMETO… uma feira medieval e uma cidade sobre rodas todos os fins-de-semana. Votem em mim!
TENHO ORGULHO… orgulho em ser uma vaca. (Assim mesmo, com dois orgulhos.) A frase não é minha. Nem de nenhuma amiga. É da Vaca Glória, da Rua Sésamo. É parte da letra de uma canção que está na minha cabeça desde os anos 90.
dói-dói no menino
O Ronaldo sente-se muito injustiçado, coitadinho. Então, como qualquer adulto que se sente injustiçado, decide fazer birra. Diz que não treina, diz que não joga e tudo o que tem a dizer não diz a quem deve, diz na televisão. Sai de casa, bate com a porta, chora, grita, faz queixinhas e deixa o clube a arder. Esconde-se debaixo das saias da mamã Fernando Santos, pede colinho aos meninos da Selecção e espera que alguém olhe para ele e lhe dê o brinquedo que ele tanto quer: voltar a ser reconhecido como o melhor. O que lhe interessa não é o que ele pensa que é, é o que os outros pensam. E os outros, pelo menos os mais lúcidos, já não pensam que ele é o melhor. E isso faz dói-dói no menino. O Ronaldo, que sempre foi de jogar, lutar e marcar, está, neste momento, a rebolar no chão por uma falta que não existiu. Ele é que tropeçou nele próprio.
Imagem: AFP