parou, deixou de ser
Fui ver uma peça de teatro, mas não a vi até ao fim. Um actor sentiu-se mal, e a peça acabou. O actor está melhor, e o personagem parou, deixou de ser. Perdeu, naquele momento, o coração que lhe dava vida além do guião, o actor. E ele, o personagem, sem órgão muscular, vai estando com a vida parada até à vida do actor voltar. É um gesto de amor dar a vida para que outra exista também. E o actor lá vai existindo sem saber bem qual é a sua. Representa uma e outra ou não representa nenhuma? Alguma delas é assim tão nua que dispense representação? Ou são as duas, despidas ou vestidas, que fazem delas o que elas são e do trabalho do actor um trabalho em vão? Para mim, ver uma peça de teatro é ver a duplicar. É ver actor e personagem cada um na sua vida, e ficar sempre sem saber se uma despedida impede alguma vida de voltar.