a banalidade do mal
Quando Adolf Eichmann foi julgado em Israel, Hannah Arendt estava lá – como correspondente da New Yorker. Esperava ver um monstro, mas viu “um homem normal, um simples funcionário público que cumpriu os seus deveres enquanto responsável máximo das deportações dos judeus para os campos de extermínio”.
Eichmann “apenas” agiu segundo o que acreditava ser o seu dever. Nunca reflectiu sobre o Bem ou o Mal que as suas acções pudessem causar. Não foi capaz de fazer um julgamento moral das suas atitudes – se fez, fez o julgamento errado. O Mal tornou-se, assim, banal. É o que diz a filósofa alemã e é o que nos mostra a sociedade.
De certa forma, o Mal continua banal em nós. Uma marcha do Ku-Klux-Klan apoiada pelo Presidente dos Estados Unidos é só mais uma notícia de abertura de telejornal, um ataque terrorista do Estado Islâmico é uma simples nota de rodapé. O constante bombardeamento informativo sobre guerras, doenças, injustiças, fome, assassinatos tornou-nos anestesiados perante o Mal. Não que não o reconheçamos, não que não o sintamos, mas a verdade é que o banalizámos. De tanto o vermos, de tanto o termos à nossa frente, ele acabou por fazer parte da nossa vida.
O Mal entra-nos mente adentro com uma facilidade infantil. E nós deixamos que isso aconteça – até lhe abrimos a porta. Quando nos apercebemos, já ele é mobília. E, ao fazer-lhe isso, estamos a fazer uma única coisa: a faltar-lhe ao respeito.
E essa falta de respeito talvez nasça da falta de seriedade com que o encaramos, da falta de profundidade com que o discutimos – talvez, até, da falta de profundidade com que discutimos a vida toda. Será que nos interrogamos o suficiente? Ou estaremos a engolir tudo o que nos põem no prato sem fazer grandes perguntas?
Agora somos nós que estamos cá, incapazes de resistir às ordens desta sociedade do banal – o que nos torna, também, um bocadinho Eichmann, desumanos e superficiais, meros “funcionários públicos” que cumprem os seus deveres. Sem pensar.