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#adormir

Comentários fechados em #adormir bloco de notas

O Bolsonaro percebe a Democracia muito melhor do que qualquer adversário. Também o Trump. Também o Putin. Também o Hitler. E fizeram-na funcionar (em seu favor, claro, mas em Democracia). Nós não percebemos. E achamos que ela funciona sozinha e sempre em nosso favor. Errado.

Estamos a dormir o tempo inteiro, fazemos nada durante o sono e, quando acordamos a suar com discursos de ódio e sangue, insultamos o Bolsonaro, o Trump, o Putin e o Hitler e o “povo estúpido” que vota neles. Ah, e criamos hashtags.

Não tentamos perceber a razão para a existência do Bolsonaro, do Trump, do Putin, do Hitler ou de qualquer outro fascista eleito em Democracia. Não tentamos perceber o voto do “povo estúpido”. Não tentamos, sequer, perceber a razão por que apelidamos quem vota neles de “povo estúpido”. Não tentamos perceber o nosso sono. Não tentamos perceber nada. Ainda bem que agora estamos acordados, para vermos a merda que temos feito #adormir.

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antagonista, o nosso herói

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Mais do que de heróis, precisamos de vilões. E o mundo tem-nos dado alguns. De Herodes a Gengis Khan, de Calígula a Hitler, das segundas-feiras a qualquer árbitro de futebol, são muitos os antagonistas que se nos opõem. E isso não deixa de ser estranho.

O antagonista é aquele que se opõe a algo. Não tem de ser uma pessoa, não tem, sequer, de ser um ser. Pode ser uma ideia, pode ser uma emoção, pode ser o que for, desde que represente a força opositora contra a qual o protagonista tem de lutar. E esta luta protagonista vs. antagonista é uma luta de sempre, nascida da luta dicotómica que nos vai existindo ao longo da existência entre o bem e o mal.

Mas isto do bem e do mal existe verdadeiramente? E seremos nós protagonistas ou antagonistas? Estaremos confinados a tais definições? Existindo, sendo ou estando, há sempre um antagonista.

Na ficção, é ele a alavanca que faz o herói ser herói. O que seria do Batman sem o Joker? Qual seria a importância do homem-morcego se o palhaço não fosse tão complexo no poder que exerce? O Batman não seria tão herói se o Joker não fosse tão vilão. E, quem fala do Joker, fala do Darth Vader, do Hannibal Lecter, do Lex Luthor e de tantos outros.

“Quem luta contra nós reforça os nossos nervos e aguça as nossas habilidades. O nosso antagonista é quem mais nos ajuda”. A frase é de Edmund Burke, filósofo e político emblemático do século XVIII, e reforça esta ideia: a de que o antagonista é essencial para o desenrolar da história que, no caso da realidade, se chama vida.

A vida está carregadinha deles. Os Estados Unidos, por exemplo, são exímios na arte da criação de vilões. Rússia, Iraque, Al Qaeda ou Estado Islâmico são apenas alguns do vasto leque que lhes permite manter-se como a maior potência mundial e líder do “mundo livre” – um estatuto que alcançou após um dos momentos mais sangrentos – e de maior desenvolvimento tecnológico – da História Mundial, a Segunda Grande Guerra. Aliás, os EUA não só investem na luta como também – e talvez essencialmente – na manutenção de um alvo a abater.

Ser herói per se não existe, ser herói sem vilão é ser não-herói. É o antagonista que faz o protagonista. Está escrito em todos os (bons) manuais de guionismo – “Numa história, deve ser o antagonista a comandar as operações. O protagonista apenas reage à acção do antagonista” – Robert McKee, um dos gurus da escrita de guião.

Talvez por isso o mundo gire tanto em torno do opositor, do mau, do vilão. Basta ligar a televisão e, mais do que explicações, procuramos culpados. Ter um antagonista declarado ajuda-nos a apontar armas a um alvo específico, tendo um objectivo. A ausência de objectivo deixa-nos ao deus dará. Precisamos do ódio para nos equilibrar o amor. Precisamos do não para nos equilibrar o sim. Precisamos desta certeza de equilíbrio universal.

E o universo português é paradigmático desta importância vital do antagonista. O nosso sangue melancólico talvez ajude, na medida em que nos coloca constantemente em situação de vítima perante o outro, seja ele o governo, o patrão, o árbitro ou a saudade. Não nos faltam antagonistas para combater. Só nos falta sermos heróis. É o nosso fado.

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belas e feios, ricos e pobres

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O curioso na morte é que, sobre as belas, recorda-se o pior do que foram enquanto vivas e, sobre os feios, recorda-se o quanto eles até nem eram assim tão feios. Marilyn era “toxicodependente” e “conflituosa”; al-Baghdadi era “pacífico” e “envergonhado”.

“Morreu a mais bela mulher do mundo”, escreveu Ruy Belo, assim que se soube da morte de Marilyn Monroe. Morreu o mais feio homem do mundo, escrevo eu, agora que se sabe do fim de Abu Baqr al-Baghdadi.

Nem eu sou Ruy Belo nem al-Baghdadi é Marilyn. Infelizmente para todos. Mas sou capaz de ter razão quando digo que ele era o mais feio homem do mundo.

Abu Baqr al-Baghdadi, um dos mais desumanos líderes jihadistas de sempre, era a cabeça (e a barba) do Estado Islâmico na Síria. Parece que morreu em Maio, num ataque dos russos. No entanto, só agora se confirma o seu fim — é o que diz o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, sublinhando a informação que está a ser divulgada pela televisão iraquiana.

Apesar da pouca confiança que devemos depositar no regime russo e, essencialmente, na televisão (seja ela de que terra for), tudo indica que, de facto, Abu Baqr al-Baghdadi morreu. Como morre toda a gente, aliás. Belas e feios, ricos e pobres, assassinos e poetas.

Quando digo feio, não falo de cara nem de corpo, que isso pouco importa para a beleza, mas de alma — ou dessa coisa que faz da pessoa o que ela é de verdade, sem o preconceito básico dos sentidos. Marilyn era a mais bela mulher do mundo por ter a alma — ou essa coisa que faz da pessoa o que ela é de verdade — bela.

O curioso nas mortes das belas e dos feios é que, por uma qualquer tentativa de equilíbrio da percepção que deixam no mundo, sobre as belas, recorda-se o pior do que foram enquanto vivas e, sobre os feios, recorda-se o quanto eles até nem eram assim tão feios (nem tão porcos, nem tão maus).

Basta googlar: Marilyn era “toxicodependente”, “conflituosa” e “fez, pelo menos, 12 abortos”; al-Baghdadi era “pacífico”, “envergonhado” e “o melhor jogador de futebol da mesquita, um Messi”.

Mas há mais. O pacifista Gandhi, por exemplo, era “misógino”, “racista” e “forçava mulheres a dormir com ele”; o tirano Hitler era “sensível”, “vegetariano” e “defensor dos animais”.

Até por cá: a popular fadista Amália era “fascista”, “contrabandista” e “bêbeda”; o ditador Salazar era “um homem bom”, “simples” e “humilde”.

Os bons tornam-se maus, os maus tornam-se bons. Tanto bons (ou belas) como maus (ou feios) continuam numa dimensão quase etérea. Às belas, sabe-nos bem vê-las cair de lá do alto, atribuindo-lhes defeitos maiores do que os que temos — inveja nossa. Aos feios, perdemos o medo quando lhes damos características de gente. Somos nós que os criamos e somos nós que os fazemos cair ou levantar – como se os obrigássemos a serem humanos.

Humanos que são belos e feios, ricos e pobres, assassinos e poetas. E eu continuo sem ser Ruy Belo. Infelizmente para mim.

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